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quarta-feira, 1 de setembro de 2010

No Salão



Ela dançava no salão. Distribuía charme e sedução, suportada por um corpo bem torneado e um palminho de cara que encapotavam bem os seus quase 50 anos. Sorria a cada piropo e em especial vibrava quando estes tinham origem em homens mais novos. Fazia-a sentir-se mais nova, como se tivesse aí a janela de oportunidade para viver o que havia ficado por viver de um casamento longo e precoce. Descobriu que agora a sua liberdade, em especial a proporcionada pelo crescimento dos filhos e aquela que lhe dava um emprego estável e bem remunerado, era um passaporte para a satisfação de quase todos os caprichos.


Gozava agora o facto de poder conhecer homens e tentar vivenciar o que conhecia dos muitos livros e poemas que bebeu, a paixão. Essa misteriosa bebedeira que nunca havia experimentado.


Naquela sexta feira como era habitual, entrou no salão já com a animação instalada e fácil foi chamar um parceiro para dançar. Era um dos muitos conhecidos e admiradores que encantado exibia a sua “conquista” e sentia o coração animado a bater mais rápido que o ritmo daquele cha-cha-cha.


Passaram alguns momentos e os olhos dela começaram a vaguear pela sala. O movimento constante, as luzes imprevisíveis e o som forte, não eram suficientes para a desconcentrar daquela figura do trintão bem parecido, bronzeado e atlético que lhe era desconhecido. Trocaram olhares e sorrisos como se não houvesse um parceiro de baile. Este só sentia que a cada passo era mais difícil acertar o compasso com ela, que ele pensava ser a sua parceira. Sentia-se perdido por ver que aqueles movimentos eram cada vez mais desordenados. Sentiu que era melhor parar. Parou.


Ela que já sabia o desfecho da sua falta de aplicação, alimentou-a até á despedida, sempre sem tomar a iniciativa. Já sabia que aquela figura tão mirada a esperava no canto do salão e que hoje sairia com ele. Ela nunca saía só do salão. Antes mal acompanhada do que só. Podia ser este, quem sabe se este tem um cálice que lhe sirva de uma vez essa porção mágica tão conhecida e nunca vivida, mesmo sabendo que não era um futuro sólido que procurava, mas apenas uma emoção momentânea em segunda ou terceira mão.


Fugiram do salão, das luzes, da agitação e do desconhecimento mútuo. Encontraram-se no calor de uma privacidade e numa agitação próxima daquela que os poemas descreviam.


Encontraram-se.


Ela voltou a perder-se.


Que importa o salão reabre amanhã.