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sábado, 18 de dezembro de 2010

PRAXIS

A chegada ao cinema e todos os procedimentos necessários para assistir ao filme, já não lhes causava estranheza. Eram um casal habituado aquele espaço e cinéfilos convictos, só lhes faltava ser um casal.

Encaminharam-se para a sala, após a refeição rápida do costume e já no alto das escadas, ela comenta a duração da fita, “… Caramba, mais de duas horas e meia…”. Impõe-se uma ida à casa de banho no sentido de precaver aflições perturbadoras do filme.

Ele ficou imóvel na entrada do corredor que dava acesso às salas. Cabeça levantada, estático, vê aproximar-se uma senhora, menos familiarizada com aquele lugar e esta entrega-lhe um bilhete em mão. Reflexamente agarrou o pedaço de papel e só instantes depois disse sorrindo:

- Minha senhora desculpe, mas eu não trabalho aqui.

As desculpas e o embaraço ficaram por conta da interlocutora. Riu-se sozinho pelo caricato da cena e quando a sua companhia chegou, contou-lhe o sucedido e riram ambos por breves instantes. Breves, já que as horas eram apertadas. Vamos indo.

Quando as luzes se apagaram e começou a avalanche de publicidade, mais uma vez o pensamento trouxe à memória a ideia de que estes infindáveis minutos, são uma perda de tempo. Lembrou-se da cena engraçada da porta.”… Mulherzinha tonta, confundiu-me com o porteiro, ou talvez não!...” .

Agiu como porteiro, na figura e na atitude, era um porteiro. Pobre mulher não se enganou. Quem se enganou foi ele ao comportar-se como tal. Sem intenção é certo, sem querer enganar ninguém, claro.

Mas, mesmo não sendo porteiro, comportou-se como tal.

Quantas vezes o latim que nos sai da boca diz uma coisa que não se coaduna com a praxis. Talvez até nos dê um certo conforto egoísta, ou talvez não.

Bem o filme vai começar.


P.S. Praxis (do grego πράξις), em seu sentido amplo, é a actividade humana em sociedade e na natureza.

2 comentários:

  1. Interessante, este texto metafórico, sobre as máscaras que por vezes usamos e com que, por vezes também, nos confundimos. Mas só por vezes.

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  2. Ser lido é bom. Se for por quem escreve bem e tem vasta experiência nas letras, então melhor. Se somarmos a isto uma ausência tão prolongada, é um grande prazer revê-la neste recanto. Muito obrigado e evite demorar tanto a voltar.

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